Estava a fazer uma analogia da minha vida com as fases de construção de uma casa. Nasceu um projecto de arquitectura para um terreno, um bebé para a vida. Até aos 6 anos, a terraplenagem, cofragem e armações de ferro, os alicerces, o início na companhia da burguesia iluminada de Portugal.
Dos 6 aos 12 as paredes e lajes, a etapa mais tosca da obra, com a mistura da areia, água e cimento, o pó, o constante exercício de nivelar os tijolos para que as paredes não ficassem tortas, a integração de uma burguesa com pais hippies num meio rural ainda a viver na idade média em finais do século XX.
Dos 12 aos 21 os projectos de águas e esgotos e electricidade. O sistema nervoso da casa, uma experiência tropical de altitude, nas montanhas de café e cascatas de Minas Gerais, estrangeira neta, sobrinha e filha dos portugueses artistas prósperos.
Dos 21 aos 30, o início dos acabamentos, o chão, o acabamento das paredes, os tectos, as janelas e as portas. Época de indefinição, tão difícil, havia tantos mosaicos e soalhos diferentes para escolher… Tantas portas, de cerejeira, pinho, carvalho, contraplacado… tantos vendedores com promoções, a sorridente trabalhadora estudante de volta à terrinha, o Portugal dos pequeninos vestidos com roupas escuras e de poucos sorrisos.
Dos 31 aos 41 o fim dos acabamentos, os rodapés, as loiças das casas de banho, os armários, bancadas e electrodomésticos da cozinha, os armários embutidos dos quartos, as pinturas e as limpezas. Tempos de concretização, família e trabalho pelos 4 cantos do mundo.
Finalmente, a casa está pronta a ser decorada. Ainda com cheiro a tinta, sento-me num colchão sem cama e olho em meu redor, uma casa vazia e com eco, preparada para receber as mobílias, as loiças, copos e talheres, os candeeiros e abajures, os tapetes e cortinas, as roupas de cama, mesa e banho, as minhas roupas, os quadros, discos e livros…
Com um entusiasmo inusitado pergunto-me: por onde vou começar?
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