28 junho 2014

De volta a casa

Eram tão mágicos aqueles momentos que partilhava com a Natureza.
Nasceres e pores de sol de tirar o ar, umas vezes combinados com nasceres e pores de luas, no mato tropical de altitude acompanhada das minhas cadelas, as que salvei por serem fêmeas e aquelas que me avisavam da presença de outras serpentes venenosas que não fossem as cascavéis. Os cheiros das plantas e da terra. As trovoadas, os relâmpagos e a chuva quente. O carreirinho de formigas vermelhas alheias às nuvens a correr no céu.
Era uma adolescente estranha aos olhos da sociedade, excitava-me com estas coisas da Natureza e lá ficava horas a contemplar as obras de Deus ou lá do que queiram chamar; sentia a sua presença, sentia-me preenchida, emocionada e feliz.
Por outro lado, sentia-me desconfortável no meio das pessoas, principalmente as da minha idade. Cheguei a considerar ir para um convento.
Mas sendo jovem com uma mente inquieta e curiosa quis estudar nas escolas dos Homens sobre aquelas maravilhas, como se davam os fenómenos. Queria ser cientista do céu e da terra. Mas principalmente queria perceber porque os Seres Humanos estávam tão infelizes, doentes, solitários, maus e vingativos. Como é que isso poderia acontecer se vivíamos num lugar tão lindo, tão perfeito? Se fazíamos parte deste milagre que é a vida. Para mim, não fazia sentido. A condição da Humanidade dava-me dor no coração e tormento na alma e de certa forma, sentia quase que uma obrigação para  “salvar” os pobres da sua dor.
E quando atingi a maioridade deixei a terra selvagem rumo à Europa civilizada para estudar os livros.
Agora que chego à chamada meia-idade vejo que de pouco me valeram os estudos académicos e as poucas obras literárias que me tocaram, muitas delas só vieram confirmar o que já sabia ou traduzir o que sentia sem perceber. Muitas obras humanas, para além das literárias, só vieram intensificar o meu tormento, dar mais provas do sofrimento e perdição Humana e conspurcar a minha inocência. 
Os estudos serviram para a minha construção conceptual da vida experimentada, muito pouco sobre a essência que “compreendia” para além dos sentidos, da mente, da ciência e da cultura. E muito menos serviram para que tivessem aplicação prática em prol da "mudança do mundo."
E aqueles que também “compreendiam” e tentaram salvar a Humanidade falharam, as suas mensagens foram incompreendidas, deturpadas e usadas para outros fins, e a Humanidade continua em sofrimento.

O que andei a fazer nestes últimos tempos foi afastar-me de mim, entrar no mundo conceptual construído pelos Humanos, tentar encaixar-me e fazer algo para o melhorar. 

E a grande lição é que não posso mudar muito, nem tão pouco salvar alguém.

Resta-me viver o grande amor que sinto, partilhar com quem o quiser partilhar, e o máximo que poderá acontecer é servir de inspiração para que outros Seres vivam em felicidade também.

Mas são os bonitos, ricos e famosos que normalmente inspiram a felicidade, e eu não sou nada disso.



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