28 fevereiro 2015

R.I.P.

As minhas avós morreram.
Tiveram longas vidas.
A Mêmê, Lia, a avó paterna nasceu em Lisboa em 1919, filha de famílias dos arredores de Coimbra foi para Paris aos 3 anos de idade. O seu pai era joalheiro e fazia peças para Lalic e outros clientes prestigiados. Na idade escolar foi para um colégio de freiras onde não gostava de dormir. Tornou-se a melhor aluna para poder ir dormir a casa dos pais. Queria estudar medicina.
Uns anos depois, em 1927 nascia em Nova Lisboa, hoje Uambo, a minha avó materna, a Vóvónita, Anita, filha de um emigrante português com uma pobre mulatinha. Como era um homem de bem, foi buscar a filha com 2 anos e enviou-a para a capital do Império viver com os padrinhos abastados a fim de receber a melhor educação. Adorava os padrinhos e vice-versa, patinava com mestria e foi campeã de ténis.
Andavam bem as duas nas suas vidas de estudantes exemplares quando se deu a 2ª guerra mundial. Hitler invade Paris e a Mêmê e a sua mãe apanharam o último comboio que saia de França após a ocupação. Ficou exilada em Portugal, interrompeu os estudos porque não falava português.
O pai da Vóvonita entretanto tinha já casado e com a vida estruturada manda vir a sua filha de 15 anos de volta para Nova Lisboa. Foi o primeiro grande desgosto dela, mal conhecia o pai…
Mas como o universo é generoso, os ventos trouxeram-lhes os seus amores (para sempre) e casaram.
O marido da Mêmê foi construir as fábricas de cimento da Matola em Moçambique durante a década de 50 e foi lá que o meu pai passou a infância. No início de 60 voltam para Portugal indo viver em Oeiras.
A guerra das colónias começou, a Vóvónita cansada das aventuras libidinosas do meu avô, volta à capital em 1962 para criar os seus 5 filhos sozinha, na Parede.
Foi aí, por volta de 1968 que os meus pais se conheceram.
A Mêmê viveu o seu grande amor, 50 anos de vida partilhada com muita alegria e cumplicidade. Viajou pelo mundo, era culta e uma mulher distinta. Uma mãe próxima, avó e bisavó interessada. Uma idosa inspiradora que cantava Edith Piaf nas festas, que tinha mais amigos jovens e que conduziu até aos 90 anos.
A Vóvónita decidiu voltar para Angola em 1970, mas com a guerra mudou-se para o Rio de Janeiro em 1974 e acabou no interior de Minas Gerais. Foi uma empresária de sucesso com clientes em todo o país. Mas nunca mais amou ninguém, embora separados, a família sabe que os avôs nunca deixaram de se amar, continuaram casados durante 50 anos e terem a desculpa para não se comprometerem. Uma mulher elegante, bela "guerreira" e educada. Uma idosa conselheira e viajante, andava sempre a visitar a família e amigos entre estados do Brasil, o Arizona e Portugal.
Por causa da união dos meus pais tornaram-se amigas, não por obrigação ou conveniência, mas porque se admiravam, talvez de tão diferentes que eram uma da outra. Tinham em comum a boa educação, um grande amor e as palavras cruzadas. Acabaram ambas velhinhas a viver com os seus filhos “preferidos” e rodeadas de cuidados, amor e atenção. E morreram no mesmo ano e mês com dois dias de diferença.
E eu perdi as minhas adoradas avós, assim, de acentada, mas aceito com serenidade porque tive relações muito especiais com ambas, contribuíram para moldar a minha peculiar personalidade e fizeram-me muito feliz.
E estava na hora de partirem para outras paragens.

E eu ainda por cá vou ficando, com as minhas memórias, gratidão e amor eterno.

27 fevereiro 2015

Romeiro

É sempre assim, tudo muito intenso. 
Umas vezes penso que é bom, o que seria de uma vida sem grandes aventuras? 
Outras, penso que é demais para o meu coração, como posso aguentar tanta emoção, tantas experiências marcantes? Porque tenho que viver assim tão intensamente? 
Ou é o destino que me dá estes desafios e abanões para não adormecer ou apodrecer nas entranhas da vida vã?